Sobrevivência dos Pirilampos

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G. Didi-Huberman

Sobrevivência dos Pirilampos

Existem pequenos insectos para os quais a luz, emitida por uma substância química, a luciferina, é um desfile de casamento, uma dança de amor. Mas mil pirilampos, em conjunto, dificilmente conseguem produzir o lume de uma vela. Todavia, a imagem dessa nuvem fosforescente que pontua a escuridão, prestou-se a argumentos e a considerações apocalípticas. «Trocaria a Montedison inteira por um pirilampo», escreveu Pasolini em 1975. Esta observação remonta aos anos da guerra, em 1941, quando ainda jovem, via em êxtase «uma quantidade imensa de pirilampos que formavam bosquezinhos de fogo nos arbustos». Mais tarde, a desaparição dos pirilampos tornar-se-ia a metáfora de um «genocídio cultural» e a constatação de um novo fascismo, pior que o anterior: o neocapitalismo, que com o estertor das luzes do espectáculo e o aplauso triunfante do seu brilho artificial relegam para a obscuridade os homens e os povos sem poder. No «Artigo sobre os pirilampos», Pasolini deter-se-á na alusão poética e política de um mundo humano que, tal como os pirilampos, corre o risco de desaparecer perante o avanço irreversível dos estereótipos sociais e culturais instaurados pela sociedade de consumo. Mas será que os pirilampos estão realmente condenados a desaparecer? G. Didi-Huberman, em diálogo e contraponto crítico com G. Agamben, G. Debord, H. Arendt, e muitos outros, analisa o desespero que impediu Pasolini de ver mais além. A barbárie e os tempos de catástrofe não obscurecem os vislumbres que apesar de tudo resistem. Os pirilampos resistem e são ainda possíveis. O luto pelo arcaico não deve, pois, paralisar a exigência de pensar o presente. Trata-se, então, de compreender o papel e o significado político das imagens para além do uso estético que os poderes vão, paulatinamente, constituindo na história; compreender o que sobrevive à margem das grandes luzes e reconstruir a experiência pela qual cada nova geração, como afirma W. Benjamin, recebe a herança dos vencidos.

Georges Didi-Huberman

G. DIDI-HUBERMAN (n. 1953), filósofo e historiador de arte, leciona «antropologia do visual» na École des hautes études en sciences sociales, em Paris. Publicou mais de 60 livros sobre autores como Warburg (a quem consagrou uma monumental e notável monografia), Bataille, Benjamin, Brecht, Carl Einstein, e sobre diferentes artistas, como Fra Angelico, Botticelli, Giacometti, Turrell, Eisenstein ou Pasolini. Destaca-se ainda o seu importante papel na curadoria de exposições internacionais como Atlas ¿Cómo llevar el mundo a cuestas? (2010), Histoires de fantômes pour grandes personnes (2012), Atlas, suite / Afteratlas (2014), Nouvelles histoires de fantômes (2014) e Soulèvements (2017), as quais tiveram apresentações em diferentes cidades europeias e sul-americanas. A fecundidade teórica e crítica da sua obra é imensa, sempre atenta à vida e ao pensamento das imagens.